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  • Foto do escritorAne Caroline Costa

Escrever é um exercício.




Já parou para pensar que escrever não é uma arte? Pois é, sei que é uma verdade dura, mas é ainda melhor que a ilusão e o romantismo. A arte é o produto, a literatura. Escrever é um exercício! E o processo é, muitas vezes, vagaroso, tenebroso e que parece não ter fim. ⁠

Por que precisamos parar de pensar que escrever é uma arte? Se acreditamos nisso, então acreditamos que somente quem tem talento consegue escrever realmente, consegue se destacar. Acontece que, assim como não existe a arte de na hora do processo de escrita, também não existe talento. ⁠

Já ouviu também que escrever é 90% transpiração e 10% inspiração? Eu também já não mais acredito nisso! Acredito que o que chamamos de inspiração é, na verdade, paixão. Isso é que faz toda a diferença. ⁠

A paixão por uma coisa faz pessoas saírem de seus países e serem médicos sem fronteira, faz pessoas aderirem ao celibato, abdicar de coisas materiais e ir ser franciscano, e faz pessoas como eu passar horas na frente de um computador criando histórias sem nenhum prospecto de salário ou reconhecimento. ⁠

Se não existe esse 10% de paixão, então o exercício da escrita não vai ser prazeroso. Não significa que você não vai conseguir escrever um livro, e é provável que você seja até mais objetivo do que os apaixonados, pensando em marketing, em público-alvo, e naquelas coisas todas! ⁠

Eu não pensava antes e — embora agora me esforce um pouco para criar esse tipo de vínculo com o leitor — o que me move é a paixão. É só isso que me faz, depois de um dia de trabalho ardo, ainda encontrar fôlego para escrever mil palavras. O desejo de ver a história se formando é maior que o cansaço. Se eu não escrevo, tudo que eu imagino não se torna real. ⁠

Então, ao invés da inspiração — da musa dos poetas românticos — Eu acredito na paixão que nos move e nos faz escrever mais uma página. ⁠

Mas o resto deste post será dedicada a transpiração, que são os 90% restantes desta equação. ⁠


Rotina

Se você me perguntar a melhor maneira de escrever um livro, eu vou te falar — escreva todos os dias. Mesmo cansado, mesmo achando que o texto está ruim, escreva. Mas para ser bem sincera, eu não faço isso.


Quando você começa um desafio tipo National November Writing Month, você precisa repensar sua rotina. Para ter sucesso no #NaNoWriMo, é importante tentar escrever pelo menos 1667 palavras por dia, para que no fim de 30 dias você tenha 50 mil. Ao fim do mês, eu consegui escrever 41 mil palavras. Não atingi o máximo, mas também não desisti no meio do caminho, mesmo quando percebi que não ia atingir o objetivo.


No início do mês, repensei minha rotina e encaixei a escrita no meu melhor horário. Novembro é um mês difícil para mim, fim de semestre, sempre com muita coisa para corrigir. Tudo que é obrigação para mim — preparar aula, corrigir redação de aluno, escrever a minha dissertação — precisa ser feito até antes do almoço. Todos os dias eu preciso fazer umas 4 horas dessas obrigações.


A única coisa que eu faço cansada, depois de um dia de trabalho, é escrever. Ainda vou, tenho fé nisso, poder escrever durante a manhã, a melhor hora para mim. Não é o que eu posso fazer agora. Então sempre começava a escrever à noite, por uma, duas horas (às vezes, até mais).


Fiz isso durante o mês inteiro, descumpri durante poucos dias, no fim do mês, quando fiquei sem tempo e tive de ficar corrigindo redação durante a noite. E escrevi 41 mil palavras.


Rotina é tudo, mas falar que eu conseguiria fazer isso durante todos os dias da minha vida é uma ilusão. Acredito que, além de rotina, precisamos de planejamento.


Planejamento e rotina podem te ajudar a ter uma meta para finalizar seu livro — e assim não cair no limbo das reescritas.


Pegue seu esqueleto, detalhe suas cenas. Por exemplo, o livro que estou escrevendo provavelmente vai ter 160 mil palavras (não façam isso!). Se eu escrever 40 mil palavras por mês, vou terminar de escrever esse livro em 4 meses. Isso é meta e planejamento e, por 4 meses, talvez isso pode ser possível.


Ajuste sua rotina ao seu planejamento e tenha bons resultados!


Primeira versão

Uma história nova vem para mim em começo e fim. Eu geralmente sei como vai começar (isso me vem como algo inusitado que move a trama) e sei como vai acabar (o arremate final pode mudar, mas eu geralmente tenho uma ou das opções de final.


Acho que, como muitos autores, o meio é o que me assusta mais. Como vamos encher aquelas 50 mil palavras (pelo menos)? E é evidente que quanto mais escrevemos, melhor vamos ficando nisso.


Aprendi com minha amiga e mentora @tayrine.batista a fazer esqueletos. Embora eu sempre tenha feito esqueletos, comecei a levar esse lance mais a sério.


Quando você faz um esqueleto, e realmente pensa como vai ser cada cena, isso ajuda a mover a escrita nos momentos mais difíceis — o que leva seus personagens do início até o fim.


Nesse primeiro momento, tento fazer o resumo de cada cena, apesar de que isso pode (e deve) mudar durante o processo de escrita. Faço uma tabela com duas colunas. A primeira com o capítulo (e o tema), e a segunda coluna com as cenas.


À medida que vou escrevendo e adicionando cenas, vou acrescentando notas a essa tabela. É importante para mim trabalhar o esqueleto junto do texto, porque com o esqueleto você pode visualizar melhor o que você está fazendo no corpo do livro.


Imagina ter que ficar indo e voltando num documento de 200, 300 folhas? Não, minha gente! Você precisa de um resumo, uma estratégia para que seja mais fácil visualizar seu trabalho.


Muita gente faz isso em planilhas de Excel, mas eu faço no WORD mesmo, com tabelas, porque acho mais fácil de mexer. Também tem gente que gosta de algo para tocar, escrever, e também pode dar certo. Acho válido fixas, post-its nas paredes, tudo que for necessário para fazer essa etapa de construção mais visual.


Acabar de escrever a primeira versão é uma dádiva. A gente se sente o dono do mundo. Mas é só o começo, pois a parte mais importante, a lapidação desse diamante bruto, começa depois do FIM na última página.


Trabalhe sua rotina e seu planejamento para que essa primeira versão fique pronta rápido. Você pode mudar o que está errado depois. Finalize seus projetos!


Personagens

Se me perguntarem “como faço para criar personagens complexos?” vou responder: Construa seus personagens, saiba tudo sobre eles, até o tipo sanguíneo. Faça isto antes de começar a escrever.


Mas, já diz o ditado, casa de ferreiro, espeto de pau. Eu sou rebelde e não faço isso. Pronto, falei.


Se eu for ser bem sincera com vocês, eu cometi um erro durante esse #NaNoWriMo. Eu achei que eu poderia pegar um esqueleto de três anos atrás e escrever a história com os mesmos personagens.


Acontece que numa saga tipo a saga da Eva, onde cada livro se passa em um ano da vida dela, os personagens mudam muito e eu não me atinei para isso.


No meio de novembro, eu percebi que o que eu tinha planejado para o livro três da saga não podia acontecer daquele jeito, porque não mais era coerente com os personagens. Olha que maluquice, gente!


Nessa primeira versão (eu estou mais ou menos em um terço do livro), os personagens realmente me guiaram por um novo enredo e eu não tive outra escolha a não ser seguir com eles.


E pasmem, não só eu estou muito mais feliz com o resultado, como também está tudo muito mais coerente com que os personagens são nesse momento da história. Sem contar que agora os conheço muito mais.


Então me ocorreu algumas coisas.


1. Não é porque você está usando os mesmos personagens, que você não precisa se ligar para o momento da vida deles. O que eles aprenderam e o que ainda precisam crescer. Isso quer dizer que preciso praticamente de outra ficha de personagem, pois eles mudaram ao longo do livro anterior.


2. A flexibilidade é uma aliada. Não adianta começar uma história achando que sabe tudo o que vai acontecer, pois nem sempre é o caso. Às vezes, a história vai andando e você se vê indo junto dela. E está tudo bem.


3. Finalmente, quando não se sabe aonde vai, qualquer lugar serve. Então deixe se levar um pouco. São esses momentos de criatividade mais genuínas que trazem as melhores partes da história. Durante esse processo, as cenas que mais gostei de escrever foram as que eu não planejei.


Cenas




O que instigou a ideia desse post foi uma cena! Uma cena muito BOSTA que eu escrevia e pensava, "Que merda!" e continuava escrevendo. E por que é importante continuar escrevendo?⁠

Simplesmente, você não pode editar uma coisa que não escreveu. É sempre melhor ter uma cena bosta que você nunca vai mostrar para ninguém, do que não ter cena nenhuma. ⁠

Ao mesmo tempo, às vezes, você escreve uma cena nos 48 do 2 tempo, e acaba indo para a versão final do livro. (Se você já leu Eva. Vanguarda e quer saber qual foi a cena do 48 do 2o tempo, manda um direct). ⁠

Na primeira versão, não penso demais se a cena está ou não contribuindo para a trama. Às vezes, eu sei que não está. Às vezes a cena toda precisará ser refeita, ou até mesmo cortada. Mas a primeira versão não é a hora de fazer isso! ⁠

Para mim, a primeira versão é a hora de sentar e escrever tudo sem se preocupar se está bonito, se está bom, para acabar. Quando você tem algo pronto, mesmo que seja uma merda, você tem algo para melhorar. Um diamante bruto que precisa ser lapidado, como diz minha amiga @alexandra.vidal. ⁠

Depois, na revisão, eu me pergunto três coisas. ⁠

1. Essa cena pertence a esse livro? E tudo bem se a resposta for não. Às vezes, em sagas, uma cena pertence ao livro seguinte. Eu mudei várias cenas para livros posteriores e não me arrependi. Os acontecimentos que precederam mudaram a cena completamente e eu estou muito mais satisfeita. ⁠

2. A cena desenvolve o personagem e move a trama? A cena precisa fazer pelo menos um dos dois, mas se fizer os dois melhor ainda! Por exemplo, eu tenho diversos personagens secundários que acabam tendo arcos importantes. Mas os arcos desses personagens secundários também afetam os protagonistas. Se não afetar, parece que não serve para nada. Porque leitores embarcam na leitura por causa dos protagonistas! ⁠

3. A cena tem conflito? A resposta precisa ser sim. Se não tiver conflito, a cena precisa ser revista ou deletada. Esse conflito pode ser interior ou exterior. Narrativas se movem por causa dos conflitos. ⁠


Diálogos



Durante esse #NaNoWriMo, toda vez que eu começava a escrever, já começava em um diálogo. Nunca ninguém falou tanto em um livro para mim.


Porém, quando escrevo, eu tento sempre fazer um balanço entre contar e mostrar. Aquela velha regra do “conte, não mostre” é válida, claro. Mas, muitas vezes, eu gosto mais do que escrevo quando estou “contando” ao invés de “mostrando”. O que vocês acham?


Mas talvez por eu estar escrevendo a primeira versão, os diálogos estavam fluindo como água. Acredito que isso aconteceu porque é, tecnicamente, mais fácil escrever diálogos. Porém, bons diálogos são, na verdade, difíceis de escrever.


1. Diálogo precisa ter propósito na narrativa (assim como qualquer outra coisa que você for fazer). Eles precisam levar a história adiante, revelar mais sobre seus personagens, e ajudar o leitor a entender o relacionamento entre os personagens. Essas três coisas são essenciais, se não tiver isso, é uma perda de tempo para a história.


2. Diálogos precisam ser rápidos. Tudo bem, essa regra eu estava super ignorando quando escrevi no NaNo, mas vou me lembrar dela na revisão. Não dá para ficar páginas e páginas escrevendo um diálogo — não é para seu romance virar uma peça de teatro.


3. De jeito nenhum faça seus personagens ficarem de conversinha, “Tudo bem com você?” “Tudo ótimo. O que fez hoje?” “Nada demais, e você?” “Também não fiz nada” — fala sério, você ficou entediado só de ler esse exemplo, não foi? Na verdade, eu acho que esse tipo de conversa podia ser eliminada das nossas vidas! Somente faça isso se você quer passar uma mensagem, tipo a cena maravilhosa de “Meninas Malvadas” — “É três de outubro”. Fala comigo sobre conversinha sendo usada de forma genial.


4. Diálogo para revelar informações, cuidado com esses vilões disfarçados de mocinhos. Não deixe os personagens falarem por horas sem intromissão. Faça uma conversa genuína.


5. Voz. Seus personagens devem ter suas próprias vozes, personalidades, e maneira de se comportar. Ninguém fala do mesmo jeito. Num diálogo, isso é extremamente importante.

E aí? Quem mais ama diálogos?


Temas



Para finalizar, vamos falar de temas. Tudo que eu escrevo tem um tema. E o que é isso? Uma narrativa tem diversos elementos, tipo personagens, enredo, ambientação — e esses elementos trabalham juntos para construir um tema. ⁠

Então, toda narrativa tem tema? Eu diria que sim, mesmo quando o autor não pensou nisso antes, a narrativa tem um tema. O tema é o seu arco narrativo, sobre o que a sua história fala. Há temas mais comuns, como o amor, a solidão, a morte. ⁠Ou mais complexos, como a superficialidade da vida pós-moderna (fui fundo agora). ⁠

O tema é uma das coisas mais importantes na narrativa. Quando o leitor reconhece o tema, ele pode tirar conclusões sobre a narrativa de modo geral. ⁠

Vanguarda, o primeiro livro da saga da Eva, traz diversos temas. Na verdade, cada capítulo é pensando em torno de um tema. Para quem já leu, sabe que os capítulos são grandinhos, pois eles não são pensados como cenas. Isso é uma questão pessoal, gente. Eu prefiro livros com menos capítulos. Os meus geralmente são focados em torno de um tema principal que tem um peso no tema global da trama. ⁠

O tema global de Eva. Vanguarda é imigração e xenofobia. O livro começa quando Eva chega à pequena cidade de Vienna, na Inglaterra, para fazer faculdade. ⁠

O capítulo 2 de “Eva. Vanguarda” se chama Alienígena — e é um dos meus capítulos favoritos, pois eu acredito que ele funciona bem nesse sentido estrutural e temático. Nesse capítulo, Eva está recém-chegada à universidade e seus primeiros contatos com professores e alunos a fazem se sentir como um alienígena. Quem já morou fora, sabe que essa é a palavra que define quem não é de lá nos papéis imigratórios — alien. Então esse capítulo evoca algo que ela sente durante todo o tempo que decorre, e contribui para o tema principal do livro, que é a xenofobia.⁠


Já pensaram em estruturar sua narrativa em volta de um tema?


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